segunda-feira, 10 de março de 2008

Liberdade

Palavras tortas numa manhã cinzenta, foi assim que ele disse adeus ao velho mundo erguido com paredes de algodão. Tudo ao seu redor era inconsistente, sem sabor ou graça. Tinha emprego, mulheres e algumas regalias! Mas isso não era suficiente, era aterrador saber que o dia seria igual ao anterior.
O café da manhã, as conversas com os vizinhos o trabalho, a rotina, a noite conflitante e muitas vezes incoerente. Mas aquele dia era especial, ele sabia que nada seria como antes, vendeu o carro, os móveis, as roupas do seu armário, ficou apenas com as do corpo. Estava aflito com a nova vida que havia escolhido mas sabia que seria livre. Estaria longe de rótulos sociais do tipo, você conquistou isso ou aquilo! Os amigos não o veriam mais com a expectativa de saber o quanto ele venceu, na verdade não o veriam mais. Sim aquele era um dia especial, importante, talvez até divino!
Ele fechou a porta do apartamento alugado, jogou a chave fora, deixou um bilhete de adeus ao proprietário e deixou tudo para trás. Levou nos bolsos o dinheiro que restou com a venda dos únicos bens que restaram, entrou na clínica, deu um abraço no médico e agradeceu a santificada lobotomia.

Um comentário:

Unknown disse...

Ausência (C. Drummond de Andrade)

Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.